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Esquizofrenia

A esquizofrenia é o transtorno mental típico: de causa desconhecida, efeito devastador na mente do indivíduo, nas suas relações sociais e de trabalho, incapacitante e incurável, em geral incidente em adolescentes e jovens, decretando-lhes um destino sombrio já na flor da idade. Podemos entender porque já foi considerada o câncer da psiquiatria.                

Mas, como o câncer, que hoje já conta com recursos que garantem seu controle e até a cura em certos casos de detecção precoce, também os recursos terapêuticos para controlar a esquizofrenia já lhe retiraram esse estigma e os portadores desse distúrbio já podem contar com a possibilidade de um prognóstico mais favorável, como veremos a seguir.                

Antes, vamos tentar colocar em poucas palavras o conceito de esquizofrenia de uma forma compreensível. Como já vimos, ela costuma incidir na idade mais promissora do indivíduo, a adolescência e a juventude, menos frequentemente na idade adulta e raramente na velhice, como uma esquizofrenia tardia. Pode ter início insidioso, com alguns comportamentos bizarros, tendência ao isolamento, atos desatinados, confundíveis com uma conduta apenas excêntrica; só a evolução para uma conduta claramente desajustada fará a diferenciação. Também pode se apresentar como um episódio agudo, com agitação psicomotora imotivada, auto e hetero-agressividade, alucinações predominantemente auditivas, ideias delirantes geralmente confusas, sem estruturação, pensamento bem perturbados em sua forma, chegando a desagregação total. A afetividade fica empobrecida, chegando ao embotamento completo. Em certas formas da doença, surgem alterações psicomotoras, como estereotipias motoras, maneirismos, flexibilidade cérea, até o estupor.                

Após o primeiro surto, o quadro pode evoluir muito mal, sem recuperação satisfatória, um tipo de evolução maligna, dita processual. Felizmente, este processo não ocorre na maioria dos casos e, após o surto, pode haver uma conduta mais adaptada, com um quadro controlável. Dados estatísticos mostram que 60% evoluem de forma satisfatória, sendo 30% os que chegam a quase cura.                              

O quadro foi primeiramente identificado por um psiquiatra alemão, Emil Kraepelin, que denominou a doença como demência precoce, com base em duas características que lhe pareciam essenciais: o início em jovens e o transcurso crônico e incurável. Porém, a observação de vários casos veio mostrar que nem sempre os casos evoluíam para a demência, havia casos mais benignos e podiam ocorrer em idade mais avançada. Surgiu então a atual denominação para esse quadro mental, esquizofrenia, proposto pelo psiquiatra suíço Eugen Bleuler, que teve aceitação geral e perdura até hoje.                

Até meados do século XX, os esquizofrênicos viviam internados em manicômios, muitos até a morte, pela falta de recursos terapêuticos eficazes. Em 1950 foi colocada em uso a clorpromazina, um medicamento que controlava o surto psicótico e melhorava a evolução do quadro, o que permitiu a libertação de muitos doentes. A clorpromazina é um antipsicótico pertencente ao grupo das fenotiazinas, dentre as quais vários outros produtos de indicação similar se desenvolveram: levomepromazina, thioridazina, propericiazina, trifluoperazina, flufenazina estão entre os utilizados até hoje.                

Mais ou menos na mesma época, foi desenvolvido o Haloperidol, do grupo das butirofenonas, mas liberado só no fim da década 60. Mais eficaz, seu uso se impôs até os dias atuais, e com a vantagem de ter uma forma de depósito de liberação lenta, que permite o uso injetável mensal, o Haloperidol Decanoato.                

No Brasil, a clorpromazina se vulgarizou como Amplictil e o haloperidol como Haldol.                

Esses medicamento causam efeitos colaterais, alguns controláveis por medicamentos, como o beperideno, contra a chamada impregnação neuroléptica, em que o doente se sente desassossegado, com ímpeto de marchar (acatisia) ou apresenta hipertonia muscular, com contrações, salivação, protrusão da língua. Apesar de impressionáveis, esses efeitos são plenamente controláveis. Um efeito mais grave, felizmente menos frequente, advém do uso contínuo e se chama discinesia tardia, com movimentos buco-linguo-mastigatórios contínuos, de difícil controle.                

Esses antipsicóticos dos grupos fenotiazínicos e butirofenonas são eficazes nos sintomas agudos, como agitação, alucinações e delírios, chamados sintomas positivos e são chamados antipsicóticos típicos, por combaterem sintomas característicos da esquizofrenia.                

Porém, existem sintomas residuais, como apatia, insociabilidade, indiferença, contra os quais pouco atuam os antipsicóticos atípicos. No fim da década de 90 do século passado, apareceram antipsicóticos capazes de melhorar os sintomas negativos, como a Clozapina, depois seguindo-se outros, como a Olanzapina, Risperidona, Ziprazidona, Aripiprazol, eficazes nesses sintomas e que favoreciam a ressocialização dos pacientes.                 

Como se vê, a investigação psicofarmacológica reforçou o poder terapêutico e consequentemente a melhora de vida dos pacientes, ao permitir sua reinserção social.                

Antes do desenvolvimento de medicamentos eficazes, em fins da década de 30 e a partir dos anos 40, utilizou-se a convulsoterapia, inicialmente provocada pela injeção de cardiazol e depois por estímulo elétrico, que passou a prevalecer sobre o nome de eletroconvulsoterapia, popularizada como eletrochoque. Atualmente esse recurso praticamente não é usado para o tratamento da esquizofrenia, a não ser para o estupor catatônico, quadro muito grave em que o paciente permanece totalmente indiferente, em geral em postura de rigidez catatônica, incomunicável, sem falar e recusando a medicação e alimentação, pondo-se em risco de morte.                

A par dos tratamentos biológicos, foram se desenvolvendo estudos psicológicos e sociológicos para o tratamento psicossocial do esquizofrênico e a aplicação de novas técnicas de abordagem psicanalíticas e cognitivo-comportamentais, têm contribuído para a melhora da comunicação afetiva e a interação social desses pacientes.                

Para o tratamento do doente mental se dispões de uma rede assistencial que vai desde a atenção ambulatorial (CAPS) até a internação psiquiátrica. A internação se justifica quando o quadro é muito agudo e incontrolável, pondo em risco a integridade física do paciente e seus familiares e deve durar o tempo suficiente para seu controle e viabilização da continuidade do tratamento externo.                

Quanto à causa da esquizofrenia, muito se investiga e pouco se sabe de confirmativo sobre sua etiologia. As investigações prosseguem em vários domínios: genético, bioquímico, neurofisiológico, com recursos de tomografia, ressonância magnética, tomografia por emissão de pósitrons (PET) e tomografia por emissão de fóton único (SPECT). Espera-se que dados mais precisos possam surgir para melhorar nosso conhecimento desta temível e misteriosa desordem mental.